sábado, 25 de março de 2017

REFLEXÃO

REFLEXÃO


Penso nas minhas noites de insónia,
Creio que nem sonho, nem durmo…
Preocupam-me apenas as olheiras,
Porque são o espelho do meu olhar…
Marcas de apreensão e de uma vida.
Distante, vago, cigarro nos dedos,
Creio que na existência campónia,
Do ser provinciano que me assumo,
Se vão misturando ilusões e asneiras
Que dia-a-dia já não consigo parar!
É a consciência de existir, sofrida…
É a assunção íntima de todos os medos!
E sem qualquer cerimónia,
Desabafo a revolta que calo, para mim…
No entanto, é nos copos de cerveja
Ou, no Whisky com gelo, quase sem sabor…
Que abato estes receios e temor.
Sem dúvida, sou o tolo porreiro,
Igual à insanidade deste nosso mundo,
No mais vulgar respeito e consideração,
Pergunto-me então, se são mesmo assim
As profundas razões de tanta inveja
Com que me dão o meu mesquinho valor,
E o tal modo subtil sempre interesseiro
Que me ofende e  toca bem fundo
Roubando-me o direito à minha razão.
Por isso, atrás de um, vem outro cigarro,
Um turbilhão de fumo bem cinzento…
A mão, tímida, posta sobre a boca
A expressão tensa e carregada da face
E o silêncio que fala sem querer,
No aceno do sim, à minha discordância…
Entro num jogo oposto, mesmo bizarro
O adequado e agradável ao momento
Satisfazendo mais uma cabeça oca…
Ansiosa de protagonismo e realce
Mas deficiente no mais elementar saber
E prenha da mais profunda ignorância.
É por isso que me perturba a tristeza,
E me magoa essa imensa ingratidão
Daqueles que na sua elevada vaidade
Me julgam como um pobre e vil coitado
Digno de pena e até quem sabe, de dó,
Perante a elite do jogo político imundo.
Eu, que sou a incerteza na certeza,
Abro a todos o meu pobre coração,
Sabendo não mudar na minha idade
E estar irremediavelmente isolado.
Tanta gente ao lado e eu estou só,
Sentado, fumando um cigarro e olhando o mundo.

Raiz do Monte (Maio 2002)

1 comentário:

Ler é dizer Olá! Ao autor.