REFLEXÃO
Penso nas minhas noites de
insónia,
Creio que nem sonho, nem durmo…
Preocupam-me apenas as olheiras,
Porque são o espelho do meu
olhar…
Marcas de apreensão e de uma
vida.
Distante, vago, cigarro nos
dedos,
Creio que na existência campónia,
Do ser provinciano que me assumo,
Se vão misturando ilusões e
asneiras
Que dia-a-dia já não consigo
parar!
É a consciência de existir,
sofrida…
É a assunção íntima de todos os
medos!
E sem qualquer cerimónia,
Desabafo a revolta que calo, para
mim…
No entanto, é nos copos de
cerveja
Ou, no Whisky com gelo, quase sem
sabor…
Que abato estes receios e temor.
Sem dúvida, sou o tolo porreiro,
Igual à insanidade deste nosso
mundo,
No mais vulgar respeito e
consideração,
Pergunto-me então, se são mesmo
assim
As profundas razões de tanta
inveja
Com que me dão o meu mesquinho
valor,
E o tal modo subtil sempre
interesseiro
Que me ofende e toca bem fundo
Roubando-me o direito à minha
razão.
Por isso, atrás de um, vem outro
cigarro,
Um turbilhão de fumo bem
cinzento…
A mão, tímida, posta sobre a boca
A expressão tensa e carregada da
face
E o silêncio que fala sem querer,
No aceno do sim, à minha
discordância…
Entro num jogo oposto, mesmo
bizarro
O adequado e agradável ao momento
Satisfazendo mais uma cabeça oca…
Ansiosa de protagonismo e realce
Mas deficiente no mais elementar
saber
E prenha da mais profunda
ignorância.
É por isso que me perturba a
tristeza,
E me magoa essa imensa ingratidão
Daqueles que na sua elevada
vaidade
Me julgam como um pobre e vil
coitado
Digno de pena e até quem sabe, de
dó,
Perante a elite do jogo político
imundo.
Eu, que sou a incerteza na
certeza,
Abro a todos o meu pobre coração,
Sabendo não mudar na minha idade
E estar irremediavelmente
isolado.
Tanta gente ao lado e eu estou
só,
Sentado, fumando um cigarro e
olhando o mundo.
Raiz do Monte (Maio 2002)